segunda-feira, 5 de outubro de 2009

LA NEGRA



No último domingo, aos 74 anos, faleceu em Buenos Aires a cantora argentina Mercedes Sosa. Dona de uma voz forte e marcante, La Negra jamais se contentou em apenas interpretar canções. Fez de sua voz a voz dos oprimidos, dos explorados, a voz dos sem voz. Em suas canções, entonou desejos de liberdade e de igualdade tão almejados pelo sofrido povo latino-americano. Ativista em movimentos de esquerda na Argentina, carregava em seu semblante a mistura de traços europeus e indígenas, que faziam dela um exemplo da mestiça população sul-americana. E como tal, jamais se furtou a tarefa de falar por sua gente.

Aprendi a admirá-la quando ainda era criança e a via cantando na televisão, muitas vezes ao lado de músicos gaúchos em programas ou festivais de música nativista. Havia alguma coisa naquela senhora gorda, dona de um vozeirão único que me encantava. Desde então me tornei um admirador da sua obra.

Há pouco mais de um ano consegui realizar um dos meus dois desejos em relação a ela: assistir a um show seu. O segundo desejo, tirar uma foto ao seu lado, não pude concretizar. Durante a apresentação, Mercedes Sosa precisou cantar sentada em uma cadeira, pois já não tinha forças para segurar um show em pé, por cerca de duas horas. Confesso que me emocionei ao ver aquela mulher que sempre me pareceu tão forte, entregar-se à fragilidade de cantar sentada devido a problemas de saúde. Mas a despeito da fraqueza do corpo agravada pela doença (ela sofria de Mal de Chagas), sua voz parecia mais forte do que nunca e preencheu cada espaço do grande teatro onde se apresentou. Quase no final do show, chamou ao palco representantes de vários os países da América Latina que entraram carregando suas bandeiras. Cercada por eles, interpretou Solo le pido a Diós, de Leon Gieco. Depois disso, ficou em pé, numa admirável tentativa de agradar a todos que estavam ali lhe prestigiando, e começou a interpretar Maria Maria (de Milton Nascimento e Fernando Brant), mas seu estado de saúde não permitiu que ela chegasse ao final da música. Despediu-se e retirou-se do palco com a ajuda de um assistente.







Fui ao show para ouvi-la cantar e saí de lá admirado com esse gesto de força: mesmo por pouco mais de um minuto ela ficou em pé, mostrando a todos que é imprescindível lutar, não importa qual inimigo se esteja enfrentando.

Los únicos vencidos son los que no luchan.

Um comentário:

  1. Achei o texto meio sem querer enquanto procurava a letra de uma musica... fiquei emocionada em lê-lo e orgulhosa ao mesmo tempo.
    Parabéns.

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