domingo, 25 de outubro de 2009

greNAL

Longe do Beira-Rio.
Longe de Porto Alegre.
Num barzinho em Curitiba.
Skol gelada no copo.
Companhia de amigos e de uma prima mais fanática que eu.
greNAL nº 378.
Tradição no futebol gaúcho, um clássico onde a força só se mede em campo, com a bola no pé.
Antes do jogo, aquelas frases comuns, sempre ouvidas: greNAL é greNAL. greNAL não tem favorito.
Quando o time entra em campo, ainda que assistindo pela TV, rola aquela emoção de sempre. Será que hoje vai dar?
Jogando em casa parece que a pressão é maior.
Oportunidade de chegar perto do líder do campeonato e se aproximar das cabeças.
Um adversário sempre respeitável.
Apito.
Bola rolando.
Vamo, vamo meu Intêêêrrrr!!!
Poucos minutos de jogo e a bola na rede.
O mar vermelho se agita.
D’Alessandro. Sangue castelhano.
Colorado, colorado, nada vai nos separar...
O jogo inteiro pela frente.
Oportunidades perdidas.
Contra-ataques superados.
Mais cerveja.
Conversas cruzadas. Histórias de Cruz Alta.
Gauchada reunida.
De onde tu é?
Olhos vidrados na tela.
Puta que o pariu!
Quanto tempo ainda falta?
Bah...
Bola perigosa na área.
Ainda bem que eles são ruins (minha prima fala).
Três minutos de acréscimo.
Confusão provocada por quem não sabe perder.
Expulsão.
Bola rolando novamente. Falta pouco.
O juiz ergue o braço.
Glória do desporto nacional, ó Internacional...
Vitória com um gosto especial.
greNAL é sempre greNAL.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

BASTARDOS E GUERRILHEIROS

Nesse final de semana consegui assistir a dois filmes que eu esperava ansiosamente para ver. Um deles foi Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino, e o outro foi a segunda parte da saga do argentino Ernesto Guevara, Che – A Guerrilha, de Steven Soderbergh. Os dois filmes, cada um a sua maneira, falam sobre dois momentos da nossa história recente e sobre dois personagens reais que deixaram marcas de sua passagem pelo século XX.



Che – A Guerrilha narra a tentativa de Guevara de realizar na Bolívia uma revolução nos moldes da promovida em Cuba, que fazia parte do seu objetivo maior de estender a revolução socialista a toda a América Latina. Essa segunda parte tem um ritmo mais lento que a primeira (Che, o Argentino, que aborda a revolução em Cuba, promovida por Fidel Castro para depor o ditador Fulgêncio Batista e tomar o poder), o que a torna um pouco monótona e arrastada.
Ao mostrar os últimos passos da vida de Che na Bolívia, Soderbergh acaba centrando sua narrativa nas dificuldades ocorridas durante o movimento guerrilheiro, mas sem se aprofundar muito nas causas do seu insucesso. Diferentemente de Cuba onde o povo queria a revolução, na Bolívia a população não havia despertado para o mesmo interesse, talvez por puro comodismo ou por não vislumbrarem possibilidades de melhoras. Além disso, os partidos comunistas bolivianos, tanto o ligado à União Soviética quanto o ligado à China, se isentaram de participar do movimento e não apoiaram a causa. Ou seja, a luta era de Che e seu ideal revolucionário e dos poucos homens que acreditavam na possibilidade de vencer a pobreza e a exploração naquele país através da implantação de um governo mais justo.
Benício del Toro desempenha de forma competente seu papel e consegue levar às telas um Che acima de tudo humano, fugindo dos estigmas pelos quais é conhecido hoje em dia, tanto pelos que o endeusam quanto pelos que o crucificam. Apesar da seqüência não ter o mesmo vigor do primeiro filme, as cenas finais, onde são apresentados os últimos momentos de vida de Ernesto Guevara, são realmente emocionantes, e me fizeram pensar no que poderia ser a América Latina hoje, se ele tivesse conseguido tornar realidade seus objetivos revolucionários.



Já o filme de Quentin Tarantino, Bastardos Inglórios, aborda a ocupação nazista na França durante a segunda grande guerra. A visão de Tarantino, porém, não busca ser fiel à realidade e mistura fatos reais e ficção numa saga que conta a história de um batalhão comandado pelo tenente americano Aldo Raine (Brad Pitt) que é enviado a França para matar e escalpelar nazistas.
Além do tentente Raine, vários outros personagens se destacam no filme, como o repulsivo Coronel Landa (Christoph Waltz), o judeu-americano Donny Donowitz (Ely Roth) que mata nazistas com um bastão e um caricato Hitler (Martin Wuttke). Com doses um pouco menores de sangue do que as contidas em Cães de Aluguel e Kill Bill, Bastardos Inglórios caminha para uma vingança armada pelos judeus contra os nazistas e, diga-se de passagem, me deixou com vontade de fazer parte do batalhão dos bastardos.
A utilização do cinema dentro do cinema, como metalinguagem, também é um ponto interessante do filme, que apresenta o ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels lançando sua nova produção em um cinema que (ele não sabe) pertence a uma judia. Há ainda uma menção a Leni Riefenstahl, a grande documentarista do cinema nazista, tida por muitos como referência na história do documentário (não pelo conteúdo e sim pelas extraordinária estética que utilizava).
Ainda que seja apenas ficção, Quentin Tarantino me fez sair do cinema com a alma lavada.

Fica aí a dica de dois filmes que merecem ser vistos.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O QUE COMEMORAR EM 15 DE OUTUBRO?

Talvez poucas pessoas lembrem que hoje se comemora o dia dos profissionais de uma importante categoria, nem sempre devidamente valorizada: os professores.

E o que comemorar no dia de hoje? Salários baixos, pouca valorização profissional, salas de aulas lotadas e com péssima infra-estrutura: infelizmente esse é o retrato da educação pública do país. E mesmo assim, muitos desses profissionais da área de educação não desistem de seu maior objetivo: educar. No ensino privado, o professor se torna cada vez mais um mero prestador de serviços, submetido muitas vezes à falta de educação que os estudantes trazem de casa. A impressão que tenho é que o professor não é mais visto como uma figura a qual se deve respeito. Nem pelo governo nem pelos próprios alunos.

Lembro das greves de professores que aconteciam no meu tempo de estudante, época em que o Sr. Pedro Simon, então governador do Rio Grande do Sul, parecia ignorar as necessidades básicas dos educadores gaúchos. Como filho de professora, participei de algumas manifestações ao lado da minha mãe e de outros professores também acompanhados por seus filhos. Tenho certeza que esses pais/professores se viam em uma encruzilhada: ou lutavam para ter melhores condições de criar seus filhos ou submetiam seus rebentos ao prejuízo ocasionado por dois ou três meses sem aula.

De lá para cá, se a coisa mudou foi para pior. No Rio Grande do Sul, enquanto a governadora Yeda Crusius adquire puffs para sua casa com dinheiro público, alunos e professores são submetidos a aulas em contêineres, medida adotada pelo governo gaúcho para economizar com as reformas das escolas.

Enquanto isso, apesar do Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN) ter sido aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado em julho de 2008 pelo presidente Lula, os educadores do Brasil ainda enfrentam problemas por causa do não cumprimento da lei. O piso vem sendo ignorado em vários estados e municípios por que a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4.167), ajuizada pelos governadores de alguns estados como o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná contra o piso, ainda não foi votada.

Apesar de todos esses fatores, tenho certeza que ainda existem motivos para comemoração. O bom professor, mesmo que não seja remunerado e respeitado da forma como merece, será lembrado pelos seus alunos pela vida toda. Em função do dia de hoje, resolvi fazer um exercício de memória e recordar alguns professores que marcaram minha vida de estudante (que começou no Jardim de Infância aos 5 anos e parece não ter data prevista para acabar).

Não tenho boas recordações da minha primeira professora, a tia Sandra, que me deu aulas durante um ou dois meses: sua didática incluía uma lista negra dos alunos que conversavam durante as aulas, algo um tanto quanto sem sentido em uma turma formada por crianças de 5 anos de idade que iniciavam então sua vida escolar no Jardim de Infância. De cara já tive a oportunidade de aprender que nenhuma classe é formada unicamente por bons profissionais.

Mas depois disso as coisas melhoraram bastante. A tia Maria Helena, minha segunda professora no Jardim de Infância, me reconhece na rua quase 30 anos depois. A professora Enely, que me deu aula na 2ª série, tinha uma letra impecável, fundamental para quem ensina crianças. A professora Noeci, que dava aulas de História na 5ª ou 6ª série, era quase do tamanho dos alunos, e se sentava em cima da mesa enquanto explicava o conteúdo.

Graças às músicas da Marizinha, professora de Biologia no ensino médio, ainda lembro que a “doença de Chagas destrói o coração e o barbeiro faz a transmissão” e que “o raquitismo acontece porque falta a vitamina D”. Com a Lúcia Baptista aprendi a conjugar todos os verbos da língua portuguesa e via nos olhos da Sônia Nicolodi a paixão por dar aulas de história.

Na universidade, tive excelentes professores, como a Jânea Kessler, que foi minha orientadora na monografia do curso de Publicidade e Propaganda e a inesquecível Eunice Olmedo, que dirigia de forma peculiar e única as classes de Estética e Cultura de Massas e que foi eleita por unanimidade como a patronesse da turma de Comunicação Social da UFSM do ano de 1998.

Não posso esquecer também do professor Edison Domingues, que me deu aulas no curso de Administração e que mesmo 6 anos depois da formatura, ainda lembra dos aniversários dos seus ex-alunos e há poucos dias atrás me surpreendeu com uma ligação me parabenizando pelos meus 32 anos. Nesse dia, me contou que decidiu enfim se aposentar, aos 72 anos de idade.

Posso falar do Renato Marchetti, excelente professor do curso de especialização em Marketing da UFPR e da Celina Alvetti e do Hugo Mengarelli, do curso de especialização em Comunicação Audiovisual da PUC-PR. O Hugo chegou a se derramar em lágrimas, na sala de aula, enquanto assistíamos a uma cena do clássico “Ladrões de Bicicleta” de Vittorio De Sica. Mais recentemente tive aulas com os cineastas Luciano Coelho e Marcelo Munhoz, que conseguem, de uma forma eficiente, ir muito além da teoria, conduzindo os alunos à prática do cinema, com conhecimento e profissionalismo.

Impossível deixar de mencionar a importância de uma outra professora, a senhora Maria da Graça, minha mãe, que com grande competência me ensinou muitas coisas, dentre elas a valorizar a importância do educador.

E mesmo com tantos problemas que prejudicam a educação deste país, posso dizer que minha vida escolar tem sido premiada com excelentes mestres que me deixaram boas lembranças. E tenho a certeza de que, apesar da interferência negativa do Simon, da Yeda e da tia Sandra, ainda há muito o que comemorar nesse Dia dos Professores.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

LA NEGRA



No último domingo, aos 74 anos, faleceu em Buenos Aires a cantora argentina Mercedes Sosa. Dona de uma voz forte e marcante, La Negra jamais se contentou em apenas interpretar canções. Fez de sua voz a voz dos oprimidos, dos explorados, a voz dos sem voz. Em suas canções, entonou desejos de liberdade e de igualdade tão almejados pelo sofrido povo latino-americano. Ativista em movimentos de esquerda na Argentina, carregava em seu semblante a mistura de traços europeus e indígenas, que faziam dela um exemplo da mestiça população sul-americana. E como tal, jamais se furtou a tarefa de falar por sua gente.

Aprendi a admirá-la quando ainda era criança e a via cantando na televisão, muitas vezes ao lado de músicos gaúchos em programas ou festivais de música nativista. Havia alguma coisa naquela senhora gorda, dona de um vozeirão único que me encantava. Desde então me tornei um admirador da sua obra.

Há pouco mais de um ano consegui realizar um dos meus dois desejos em relação a ela: assistir a um show seu. O segundo desejo, tirar uma foto ao seu lado, não pude concretizar. Durante a apresentação, Mercedes Sosa precisou cantar sentada em uma cadeira, pois já não tinha forças para segurar um show em pé, por cerca de duas horas. Confesso que me emocionei ao ver aquela mulher que sempre me pareceu tão forte, entregar-se à fragilidade de cantar sentada devido a problemas de saúde. Mas a despeito da fraqueza do corpo agravada pela doença (ela sofria de Mal de Chagas), sua voz parecia mais forte do que nunca e preencheu cada espaço do grande teatro onde se apresentou. Quase no final do show, chamou ao palco representantes de vários os países da América Latina que entraram carregando suas bandeiras. Cercada por eles, interpretou Solo le pido a Diós, de Leon Gieco. Depois disso, ficou em pé, numa admirável tentativa de agradar a todos que estavam ali lhe prestigiando, e começou a interpretar Maria Maria (de Milton Nascimento e Fernando Brant), mas seu estado de saúde não permitiu que ela chegasse ao final da música. Despediu-se e retirou-se do palco com a ajuda de um assistente.







Fui ao show para ouvi-la cantar e saí de lá admirado com esse gesto de força: mesmo por pouco mais de um minuto ela ficou em pé, mostrando a todos que é imprescindível lutar, não importa qual inimigo se esteja enfrentando.

Los únicos vencidos son los que no luchan.